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Quinta-feira, 26 DE Fevereiro DE 2009

Camilo Torres (reportagem TeleSUR)

TeleSUR _ 19/02/2009

 

"Onde caiu Camilo nasceu uma cruz,
porém não de madeira,  e sim de luz".
(Victor Jará)"Não deporei as armas enquanto o poder
não estiver totalmente nas mãos do povo".
(Camilo Torres)


"Camilo Torres está vigente", realça o sociólogo Eduardo Cortez Barrero, em entrevista exclusiva para a equipa do Site da TeleSUR, comentou que na sua juventude era um dirigente estudantil venezuelano e viajou para a Colômbia para conhecer as revoluções que ali se originavam, e assim conhecer de perto as lutas revolucionárias.

"Tive a oportunidade de conhecer a liderança de Camilo, durante uma visita a Bogotá, nas lutas dos anos 60 - 70, quando se abre todo um movimento nos povos deste continente na busca da libertação nacional e contra a oligarquía", recordou Cortez.

"Ele me convidou a caminhar por umas ruas de Bogotá e ali é onde eu entendo perfeitamente a liderança de Camilo, porque saímos oito ou nove pessoas com ele a acompanhá-lo, por uma avenida muito conhecida de Bogotá que se chama a Carreira Séptima…Caminhamos pela Carreira Sétima e quando demos conta, tinhamos gente detrás e gente adiante, o saudando, aproximavam-se dele e ele tinha que improvisar comícios e parar para fazer os seus discursos", narrou.

Camilo Torres, nasceu em Bogotá o três de Fevereiro de 1929, cumprindo-se hoje (3/02/2009) 80 anos do seu nascimento. A Biblioteca Nacional da Venezuela realizou uma homenagem, a quem se converteu num dos líderes mais seguidos na Colômbia, personagem que uma vez dentro da revolução, jamais deixou perder a sua essência de religioso.

Uma vez que se ordena sacerdote em 1954, sai com a sua batina, não só a pregar o evangelho, mas também a estudar e converter-se num cientista social. Desta maneira faz-se conhecedor da realidade histórica e contemporânea de seu país, e assim se incorpora à vida política nacional. Foi então quando pendurou a batina e tomou uma arma, sem abandonar seu espírito cristão.

Lutas de Camilo

Em 1965 Camilo Torres cria o movimento Frente Unido em sua terra natal Bogotá, o que correspondia à oposição à Frente Nacional que constituíram os liberais e conservadores para alternar-se no poder.

Para fazer da sua criação um verdadeiro suporte político, incorpora-se à luta armada, obrigado em parte pelas inumeráveis ameaças contra a sua vida e ideais, no entanto, sempre manteve a promessa de abandonar os fuzis quando o povo estivesse de forma definitiva no poder, o que ainda não ocorreu.

"Era seguido pela gente em todos os lugares, isto é, era um líder e isso é precisamente o que fez com que o seu inimigo, a oligarquia colombiana criminosa, não lhe permitisse que ele abrisse um espaço pela via legal e ante as ameaças e a perspectiva do assassinarem se vai à luta armada", detalhou, em declarações à página do Site da TeleSUR, quem em vida o conheceu, Eduardo Cortez Barrero, um dirigente estudantil venezuelano dos anos 60 e que na actualidade desempenha funções de sociólogo.

Quando ingressa no Exército de Libertação Nacional "ele disse que não ia ser uma figura decorativa, é então que vai a uma acção militar em Santander do Tuy e ali morre", especificou Cortez.

Nessa batalha que teve com o Exército regular colombiano perdeu a sua vida, porque, ainda que a Frente Unida tenha triunfado, em Camilo Torres prevaleceu a sua condição de sacerdote e ao escutar os muitos homens em seu leito de morte dentro do campo onde se deram os confrontos, regressou para dar àquelas almas o Sacramento da Unção dos Doentes, e é nesse momento que foi surpreendido pela morte.

Por sua vez, o precursor da homenagem, Wolfang Vincent, geógrafo e crítico literário, quando iniciou a actividade baseada em comemorar os 80 anos do nascimento de Camilo Torres, expressou que "a liberdade da Colômbia está unida à liberdade da Venezuela, e nessas lutas Camilo foi muito representativo e protagónico, deixou tudo para batallar pelos demais".

A Colômbia de Camilo

Fome, doenças, injustiças e enquistamiento da oligarquia constituíam as principais características da Colômbia em que viveu Camilo Torres (1929 – 1966).

Um estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), realizado no ano de 2002, assinalava que "a Colômbia se encontra desde há 20 anos numa situação à beira da guerra civil onde se enfrentam tropas militares, grupos armados da guerrilha, paramilitares e os narcotraficantes".

No tempo em que viveu Camilo Torres, começaram a surgir na nação os movimentos revolucionários, que se opunham a que o povo padecesse de tanta miséria.

Nos anos 60 aparecem grupos guerrilheiros de esquerda, em 1964, nascem as Forças Armadas Revolucionárias de Colômbia (FARC) e o 1965 cria-se o Exército de Libertação Nacional (ELN)

Além disso a investigação do PNUD fala de uma violência crescente na qual os civis são as primeiras vítimas: sequestros em massa, atentados, assassinatos, ameaças de morte. Tudo o citado, originou a deslocação de milhões de pessoas que abandonaram os seus lugares de nascimento, tal como refere o citado estudo.

A teologia da libertação

Camilo Torres como cientista social, traz à realidade aqueles ensinos de Tomás de Aquino, o teólogo por excelência.

Segundo falla a "História da Filosofia, Noesis", a teologia propõe que a figura de Deus não deve permanecer em ideais, senão que é prioridade demonstrar durante a sua existência.

Aquino como teólogo, baseia os seus estudos na "preocupação intelectual e didáctica ancorada à sistematização e exposição da doutrina cristã sobre Deus".

Neste sentido, Camilo Torres não se conforma com difundir a doutrina do cristianismo, como também tenta levar a cabo um cristianismo democrático.

"Camilo Torres representa a teologia da libertação. Uma linha de sacerdotes que querem fazer desse sacerdocio uma militância para a libertação", disse em seu discurso o Director da Biblioteca Nacional da Venezuela, Ignacio Barreto, em uma homenagem que fez ao líder colombiano na citada instituição.

Se uma das premissas teológicas estabelece que "a sociedade é o meio comum que tem a humanidade para chegar a seu fim último", para Camilo Torres, esse fim último era a libertação.

O autor Roger Smalling, definiu à teologia da libertação como "um movimento que anuncia a necessidade da participação cristã nos processos sociais, na libertação das classes baixas oprimidas económica e politicamente. Afirma a validade de qualquer meio para atingir esta libertação. Inclusive recomenda o conflito armado, como necessário, se todos os meios pacíficos fracassarem".

Nessa doutrina se enquadrou Torres e muitos outros líderes latinoamericanos. As lutas daqueles revolucionários, como Sandino na Nicarágua, Martin Luther King nos Estados Unidos, o Che Guevara e outros destacados que perderam as suas vidas pela defesa dos direitos dos mais desfavorecidos historicamente, fazem-se presentes na actualidade.

"A luta deles não foi estéril, pois hoje a estamos a viveer em uma realidade, em todo este continente, na Argentina com a Cristina Kirncher, na Venezuela com Hugo Chávez, no Brasil com Lula , na Bolívia com Evo Morais, no Equador com Correa e seguirão se estendendo a cada vez mais Governos soberanos", destacou.

Luinés Daniela Sánchez

Fonte: TeleSUR

publicado por Rojo às 16:48
Terça-feira, 24 DE Fevereiro DE 2009

Chico Mendes: Um ecossocialista à frente do seu tempo

Carlos Walter Porto-Gonçalves; 6 de Novembro de 2008

 
Há 20 anos, Chico Mendes era assassinado; o legado do seringueiro e o seu sonho de uma sociedade que combinasse socialismo com ecologia continuam vivos.

Francisco Alves Mendes Filho nasceu no seringal Porto Rico no município de Xapuri em 15 de Dezembro de 1944, filho de pais nordestinos que migraram para a Amazónia.

Desde os 11 anos, trabalhou como seringueiro partilhando o destino comum àquelas famílias cujos filhos, em vez de irem à escola, trabalham para extrair o látex.

Chico Mendes teve a fortuna de encontrar aquele que seria o seu grande mestre, Fernando Euclides Távora, que não só lhe ensinou a ler e a escrever, mas o caminho que o levaria a se interessar pelos destinos do planeta e da humanidade.

Euclides Távora era um militante comunista que havia participado activamente no levante comunista de 1935 em Fortaleza e, ainda, na Revolução de 1952 na Bolívia. Retornando ao Brasil pelo Acre, Euclides Távora vai morar em Xapuri quando se torna mestre de Chico Mendes.

Chico Mendes sempre falava com grande carinho do seu grande mentor-educador-político que nunca mais veria desde o golpe ditatorial civil-militar de 1964.

 

 

EMPATES

 

A educação passou a ser uma verdadeira obsessão de Chico Mendes, a que ele dava um sentido político muito prático, pois acreditava que, sabendo ler e escrever, o seringueiro não mais seria roubado nas contas do barracão do patrão.

Em 1975, já militando nas Comunidades Eclesiais de Base – as Cebs – funda o primeiro sindicato de trabalhadores rurais no Acre, em Brasiléia, juntamente com o seu amigo Wilson Pinheiro.

Em Março de 1976, organiza juntamente com os seus companheiros, o primeiro Empate no Seringal Carmen. O Empate consistia na reunião de homens, mulheres e crianças, sob a liderança dos sindicatos, para impedir o desmatamento da floresta, prática que se tornaria emblemática da luta dos seringueiros.

Nos Empates, alertavam os “peões” ao serviço dos fazendeiros de gado, geralmente de fora do Acre, de que a derrubada da mata significava a expulsão de famílias de trabalhadores; convidava-os a associar-se à sua luta oferecendo “colocações” e “estradas” de seringa para trabalhar e, firmes, expulsava-os dos seus acampamentos de destruição impedindo o seu trabalho de derrubada da floresta.

Os Empates tiveram um papel decisivo na consolidação da identidade dos seringueiros, e essa forma de resistência acabou por chamar a atenção de todo o Brasil, sobretudo após o assassinato do seu amigo Wilson Pinheiro, em 21 de Julho de 1980.

Chico Mendes insistiu com os Empates mobilizando os seringueiros, mesmo depois de as autoridades governamentais, diante da repercussão da resistência dos seringueiros, terem começado a fazer projectos de colonização.

 

 

ARMADILHA

 

Chico Mendes, desde então, mostraria uma lúcida compreensão do significado daquela estratégia governamental que, inclusive, encontrava eco entre militantes sindicais, recusando-a, posto que levaria o seringueiro a deixar de ser seringueiro ao torná-lo um colono-agricultor confinado a 50 ou 100 hectares de terra.

Chico Mendes valorizava o modo de vida seringueiro que usava uma restrita pequena parcela de terra junto à casa para fazer o seu roçado e criar pequenos animais e fazia a colecta de frutos e resinas da floresta. Para os seringueiros, o objecto de trabalho não é a terra e, sim, a mata, a floresta. Assim, mais que hectare de terra, Chico Mendes e os seringueiros lutavam pela floresta, e foi essa firme convicção que o levou a gozar de apoio dos seus pares e aproximá-lo dos ecologistas, o que fazia com desconfiança, como não se cansou de manifestar a amigos.

Como comunista, Chico Mendes desconfiava não só dos ecologistas como também de uma série de movimentos sociais que começavam a destacar-se naqueles anos (mulheres, negros, homossexuais) que, acreditava, dividiam a luta dos trabalhadores.

Todavia, como homem prático e com grande capacidade de subordinar os princípios à vida sem perder o sentido da sua luta, Chico Mendes percebeu que os ecologistas, ao defenderem a floresta, eram aliados importantes da luta dos seringueiros na prática, além de permitirem que os seringueiros saíssem do isolamento a que estavam confinados.

 

 

ALIADOS

 

Os ecologistas, por seu lado, reconheceram a importância da luta dos seringueiros e dos seus Empates na preservação da floresta. Dessa aliança, Chico Mendes formulou um princípio que caracterizaria a sua filosofia, «Não há defesa da floresta sem os povos da floresta», que bem pode ser estendido a outras situações de defesa da natureza.

Chico Mendes percebeu que a luta dos seringueiros era uma luta de interesse da humanidade e, pouco a pouco, vai firmando a convicção de que, além da exploração dos trabalhadores, o capitalismo tinha uma voraz força destrutiva que havia de ser combatida.

Assim, Chico Mendes vai tornar-se um dos maiores próceres do ecossocialismo pela junção da luta contra a devastação com a luta contra a exploração e o capitalismo. Enfim, desenvolvia uma fina percepção holística, recusando tanto um sindicalismo como um ecologismo restritos.

Em 1984 num encontro nacional de trabalhadores rurais, Chico Mendes defende uma ousada proposta para a época, a de que a reforma agrária deveria respeitar os contextos sociais e culturais específicos e, um ano depois, ao fundar o Conselho Nacional dos Seringueiros em Brasília, já desenvolve juntamente com os seus companheiros a proposta de Reserva Extrativista, uma verdadeira revolução no conceito de unidade de conservação ambiental que, pela primeira vez, não mais separa o homem da natureza como até então se fazia.

Costumava dizer que a Reserva Extrativista era a reforma agrária dos seringueiros. A Reserva Extrativista consagra todos os princípios ideológicos que Chico Mendes propugnava, posto que, ao mesmo tempo que cada família detinha a prerrogativa de usufruto da sua colocação com a sua casa e com as suas estradas de seringa, a terra e a floresta eram de uso comum, podendo mesmo cada um caçar e colectar nos espaços entre as estradas de cada família, ideia comunitária inspirada nas reservas indígenas.

 

O Testamento de Chico Mendes, o seu ideal

 

SEGUNDO ASSASSINATO

 

Desde então, Chico Mendes empenha-se, juntamente com o seu amigo Ailton Krenak, na construção da Aliança dos Povos da Floresta, unindo indígenas e seringueiros, invertendo a história de massacres que até então protagonizaram instigados pelas grandes casas aviadoras e seringalistas do complexo de exploração de borracha.

Aqui, também, o profundo sentido humanístico não-antropocêntrico da ideologia de Chico Mendes ganhava sentido prático. Registre-se que a proposta da Reserva Extrativista contemplava, ainda, uma inovadora relação da sociedade com o Estado, na medida em que embora a propriedade formal da reserva extrativista seja do Estado, no caso, do então Ibama, a gestão da mesma é de responsabilidade da própria comunidade, cabendo ao órgão público supervisionar o cumprimento do contrato de concessão de direito de uso que, nesse sentido, é o pacto que se estabelece entre o Estado e os seringueiros. Ou seja, o notório saber dos seringueiros torna-se o elemento-chave da concessão do direito de uso que o Estado confere a eles.

Esse princípio viria a ser violentado no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, aprovado no ano 2000 que, assim, deve ser considerado rigorosamente como o segundo assassinato de Chico Mendes, pois desconsidera o saber das populações tradicionais como a base de todo o direito que têm aos seus territórios, ao preconizar que todo o plano de manejo deve ser feito por técnicos. Temos aqui um belo exemplo da colonialidade do saber e do poder que, assim, desperdiça a riqueza da experiência humana materializada em múltiplas formas de conhecimento que a humanidade na sua diversidade inventou.

Em toda a sua vida, Chico Mendes jamais deixou de se dedicar à construção de instrumentos de lutas sociais e políticas, tendo sido dirigente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT), assim como do Conselho Nacional dos Seringueiros.

 

 

SOCIALISMO COM ECOLOGIA

 

O legado político e moral de Chico Mendes é enorme e pode ser visto tanto pelos intelectuais que reconhecem a originalidade das suas ideias e práticas políticas, como pelos políticos que, tanto no seu Estado como no país, têm os seus cargos de vereador(a), deputada(o), governador, senador(a) e ministra(o) associados às lutas que protagonizou, embora devamos reconhecer que alguns dos seus companheiros no Acre prefiram falar de “governo da floresta” e não governo dos povos da floresta.

Tanto no Brasil como no mundo, o seu trabalho foi reconhecido: em 1987, recebe, em Londres, o Prémio Global 500 da ONU e, em Nova York, a Medalha da Sociedade para Um Mundo Melhor; já em 1988, foi condecorado com o título de Cidadão Honorário da cidade do Rio de Janeiro.

A sua enorme crença na capacidade humana de superar as contradições do mundo que vive organizando-se social e politicamente, foi capaz de inspirar todo um conjunto de ideias e práticas hoje em curso no mundo, que vê a natureza, com a sua produtividade e capacidade de auto-organização (neguentropia), e a criatividade humana, na sua diversidade cultural, como bases de uma racionalidade ambiental (Enrique Leff) ou, como ele gostava de chamar, de uma sociedade que combinasse socialismo com ecologia.

Em 22 de Dezembro de 1988, assassinos ligados à UDR (União Democrática Ruralista) pensaram calar com uma bala essa voz cuja força, tal como uma poronga [1], continua a iluminar caminhos.

[1] Poronga – Instrumento que os seringueiros carregam sobre a cabeça para iluminar os caminhos na mata quando saem, ainda de noite, para trabalhar. Chico Mendes chamou de “poronga” à cartilha que alfabetizava os seringueiros.

 

Fonte da reprodução: Informação Alternativa

 

Primeiro Manifesto Ecossocialista. Michael Lowy e Joel Kovel

 

Por Joel Kovel e Michael Lowy (Setembro 2001)

O século XXI se inicia com uma nota catastrófica, com um grau sem precedentes de desastres ecológicos e uma ordem mundial caótica, cercada por terror e focos de guerras localizadas e desintegradoras, que se espalham como uma gangrena pelos grandes troncos do planeta África Central, Oriente Médio, América do Sul e do Norte , ecoando por todas as nações.

Na nossa visão, as crises ecológicas e o colapso social estão profundamente relacionados e deveriam ser vistos como manifestações diferentes das mesmas forças estruturais. As primeiras derivam, de uma maneira geral, da industrialização massiva, que ultrapassou a capacidade da Terra absorver e conter a instabilidade ecológica. O segundo deriva da forma de imperialismo conhecida como globalização, com seus efeitos desintegradores sobre as sociedades que se colocam em seu caminho. Ainda, essas forças subjacentes são essencialmente diferentes aspectos do mesmo movimento, devendo ser identificadas como a dinâmica central que move o todo: a expansão do sistema capitalista mundial.

Rejeitamos todo tipo de eufemismos ou propaganda que suavizem a brutalidade do sistema: todo mascaramento de seus custos ecológicos, toda mistificação dos custos humanos sob os nomes de democracia e direitos humanos. Ao contrário, insistimos em enxergar o capital a partir daquilo que ele realmente fez.

Agindo sobre a natureza e seu equilíbrio ecológico, o sistema, com seu imperativo de expansão constante da lucratividade, expõe ecossistemas a poluentes desestabilizadores, fragmenta habitats que evoluíram milhões de anos de modo a permitir o surgimento de organismos, dilapida recursos, e reduz a vitalidade sensual da natureza às frias trocas necessárias à acumulação de capital.

Do lado da humanidade, com suas exigências de autodeterminação, comunidade e existência plena de sentido, o capital reduz a maioria das pessoas do mundo a mero reservatório de mão-de-obra, ao mesmo tempo em que descarta os considerados inúteis. O capital invadiu e minou a integridade das comunidades por meio de uma cultura de massas global de consumismo e despolitização. Ele expandiu as disparidades de riqueza e de poder em níveis sem precedentes na história. Trabalhou lado a lado com uma rede de Estados corruptos e subservientes, cujas elites locais, poupando o centro, executam o trabalho de repressão. O capital também colocou em funcionamento, sob a supervisão das potências ocidentais e da superpotência norte-americana, uma rede de organizações trans-estatais destinada a minar a autonomia da periferia, atando-a às suas dívidas enquanto mantém um enorme aparato militar que força a obediência ao centro capitalista.

Nós entendemos que o atual sistema capitalista não pode regular, muito menos superar, as crises que deflagrou. Ele não pode resolver a crise ecológica porque fazê-lo implica em colocar limites ao processo de acumulação uma opção inaceitável para um sistema baseado na regra “cresça ou morra!”. Tampouco ele pode resolver a crise posta pelo terror ou outras formas de rebelião violenta, porque fazê-lo significaria abandonar a lógica do império, impondo limites inaceitáveis ao crescimento e ao “estilo de vida” sustentado pelo império. Sua única opção é recorrer à força bruta, incrementando a alienação e semeando mais terrorismo e contra-terrorismo, gerando assim uma nova variante de fascismo.

Em suma, o sistema capitalista mundial está historicamente falido. Tornou-se um império incapaz de se adaptar, cujo gigantismo expõe sua fraqueza subjacente. O sistema capitalista mundial é, na linguagem da ecologia, profundamente insustentável e, para que haja futuro, deve ser fundamentalmente transformado ou substituído.

É dessa forma que retornamos à dura escolha apresentada por Rosa Luxemburgo: “Socialismo ou Barbárie!”, em que a face da última está impressa neste século que se inicia na forma de eco-catástrofe, terror e contra-terror e sua degeneração fascista.

Mas por que socialismo, por que reviver esta palavra aparentemente consignada ao lixo da história pelos equívocos de suas interpretações no século XX? Por uma única razão: embora castigada e não realizada, a noção de socialismo ainda permanece atual para a superação do capital. Se o capital deve ser superado, uma tarefa dada como urgente considerando a própria sobrevivência da civilização, o resultado será necessariamente “socialista”, pois esse é o termo que designa a passagem a uma sociedade pós-capitalista.

Se dizemos que o capital é radicalmente insustentável e se degenera em barbárie, delineada acima, então estamos também dizendo que precisamos construir um “socialismo” capaz de superar as crises que o capital iniciou. E se os “socialismos” do passado falharam nisso, é nosso dever, se escolhemos um fim outro que não a barbárie, lutar por um socialismo que triunfe. Da mesma forma que a barbárie mudou desde os tempos em que Rosa Luxemburgo enunciou sua profética alternativa, também o nome e a realidade do “socialismo” devem ser adequados aos tempos atuais.

É por essas razões que escolhemos nomear nossa interpretação de “socialismo” como um ecossocialismo, e nos dedicar à sua realização.

Por que Ecossocialismo?

Entendemos o ecossocialismo não como negação, mas como realização dos socialismos da “primeira época” do século vinte, no contexto da crise ecológica. Como seus antecessores, o ecossocialismo se baseia na visão de que capital é trabalho passado reificado, e se fortalece a partir do livre desenvolvimento de todos os produtores, ou em outras palavras, a partir da não separação entre produtores e meios de produção.

Entendemos que essa meta não teve sua implementação possível no socialismo da “primeira época”. As razões dessa impossibilidade são demasiadamente complexas para serem aqui rapidamente abordadas, cabendo, entretanto, mencionar os diversos efeitos do subdesenvolvimento no contexto de hostilidade por parte das potências capitalistas. Essa conjuntura teve efeitos nefastos sobre os socialismos existentes, principalmente no que ser refere à negação da democracia interna associada à apologia do produtivismo capitalista, o que conduziu ao colapso dessas sociedades e à ruína de seus ambientes naturais.

O ecossocialismo retém os objetivos emancipatórios do socialismo da “primeira época”, ao mesmo tempo em que rejeita tanto os objetivos reformistas da social-democracia quanto às estruturas produtivistas das variações burocráticas do socialismo. O ecossocialismo insiste em redefinir a trajetória e objetivo da produção socialista em um contexto ecológico. Ele o faz especificamente em relação aos “limites ao crescimento”, essencial para a sustentabilidade da sociedade. Isso sem, no entanto, impor escassez, sofrimento ou repressão à sociedade. O objetivo é a transformação das necessidades, uma profunda mudança de dimensão qualitativa, não quantitativa. Do ponto de vista da produção de mercadorias, isso se traduz em uma valorização dos valores de uso em detrimento dos valores de troca um projeto de relevância de longo prazo baseado na atividade econômica imediata.

A generalização da produção ecológica sob condições socialistas pode fornecer a base para superação das crises atuais. Uma sociedade de produtores livremente associados não cessa sua própria democratização. Ela deve insistir em libertar todos os seres humanos como seu objetivo e fundamento. Ela supera assim o impulso imperialista subjetiva e objetivamente. Ao realizar tal objetivo, essa sociedade luta para superar todas as formas de dominação, incluindo, especialmente, aquelas de gênero e raça. Ela supera as condições que conduzem a distorções fundamentalistas e suas manifestações terroristas. Em síntese, essa sociedade se coloca em harmonia ecológica com a natureza em um grau impensável sob as condições atuais.

Um resultado prático dessas tendências poderia se expressar, por exemplo, no desaparecimento da dependência de combustíveis fósseis característica do capitalismo industrial , que, por sua vez, poderia fornecer a base material para o resgate das terras subjugadas pelo imperialismo do petróleo, ao mesmo tempo em que possibilitaria a contenção do aquecimento global e de outras aflições da crise ecológica.

Ninguém pode ler estas recomendações sem pensar primeiro em quantas questões práticas e teóricas elas suscitam e, segundo e mais desesperançosamente, em quão remotas elas são em relação à atual configuração do mundo, tanto no que se refere ao que está baseado nas instituições quanto no que está registrado nas consciências. Não precisamos elaborar estes pontos, os quais deveriam ser instantaneamente reconhecidos por todos. Mas insistimos que eles devem ser tomados na perspectiva adequada. Nosso projeto não é nem detalhar cada passo deste caminho nem se render ao adversário devido à preponderância do poder que ostenta. Nosso projeto consiste em desenvolver a lógica de uma suficiente e necessária transformação da atual ordem e começar a dar os passos intermediários em direção a esse objetivo. O fazemos para pensar mais profundamente nessas possibilidades e, ao mesmo tempo, iniciar o trabalho de reunir aqueles de idéias semelhantes. Se existe algum mérito nesses argumentos, então ele precisa servir para que práticas e visões semelhantes germinem de maneira coordenada em diversos pontos do globo. O ecossocialismo será universal e internacional, ou não será. As crises de nosso tempo podem e devem ser vistas como oportunidades revolucionárias, e como tal temos o dever de afirmá-las e concretizá-las.

 

Fonte: EcosSocialistas

 

Instituto Chico Mendes

 

29 de Janeiro de 2009 

Movimentos Sociais fizeram homenagem a Chico Mendes no FORUM SOCIAL MUNDIAL, BELÉM DO PARÁ 2009

por Ana Rogéria* en Adital.com.br**

A Tenda dos 50 anos da Revolução Cubana, instalada na cidade do FSM 2009, na Universidade Federal do Pará, em Belém, sediou nesta manhã uma homenagem para aquele que é o maior símbolo da defesa de um modelo de economia sustentável para a Amazônia: Chico Mendes. Vinte anos depois de sua morte, a atividade mostrou que o legado deixado por ele continua vivo.

 

A ideia, segundo o poeta Pedro Tierra, um dos articuladores da atividade, foi reunir num mesmo espaço pessoas que conviveram com ele e pessoas que, de alguma forma, levam a luta de defesa da região adiante. Representantes do Conselho Nacional de Seringueiros, do Comitê Chico Mendes, lideranças indígenas e ativistas ambientais estavam presentes no evento.


"Num momento singular que as esquerdas do mundo vêm tecendo, construindo, Chico Mendes marca pela vida que teve, pelo significado que teve e pelo que tem a ver com a temática que será inevitavelmente abordada durante o fórum que é a questão da sustentabilidade ambiental", explicou Tierra. A atividade contou com o lançamento do livro "Vozes da Floresta" e da publicação com os anais da sessão solene do Congresso Nacional em homenagem ao líder seringueiro, assassinado em Xapuri, no estado do Acre, há 20 anos. A programação também contou com a leitura do poema "O grito verde que anda", de Pedro Tierra.


A homenagem se completou com o "Pentágono da Paz", onde em cada um dos vértices foi plantada uma muda de seringueira. As mudas foram plantadas por representantes dos continentes. "Com todo o significado que a palavra pentágono tem para a humanidade inteira, de morte, de guerra, de opressão dos povos, o nosso pentágono se contrapõem, fazendo referência à paz, à justiça", falou o poeta. As matérias do projeto "Ações pela Vida" são produzidas com o apoio do Fundo Nacional de Solidariedade da CF2008.

 

Fonte: De Igual a Igual

 

publicado por Rojo às 12:49

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